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Embora o ponto mais elevado da bacia hidrográfica (e também do sul do país), situado no flanco sudeste da bacia, tenha apenas cerca de 902 metros de altitude, as temperaturas são aí mais baixas. O ar mais fresco, menos dissecante, ajudará durante algum tempo a que as plantas e os animais sobrevivam os extremos do aquecimento global.

As serras criam nuvens, e as nuvens podem produzir chuva. Na Serra de Monchique, a pluviosidade anual média é de cerca de 900mm, ou seja, pelo menos o dobro da maior parte do sul de Portugal. Este fator é especialmente importante para uma área que se prevê que se tornará, devido às mudanças climáticas, cada vez mais vulnerável à desertificação.

Projetando-se Atlântico adentro, franqueado a oeste e a sul por um oceano cuja temperatura superficial costeira varia aproximadamente apenas 6ºC, o vale do Seixe, sobretudo a sua parte ocidental, encontra-se na região mais temperada de Portugal, beneficiando de temperaturas moderadas no inverno e em especial no verão. Também isso favorece a diversidade da vida selvagem.

Outra consequência da influência marítima é o vento constante. Se olharmos com atenção, observam-se várias turbinas eólicas no horizonte. As condições oceânicas mais frescas, conjugadas com uma incidência solar muito forte, asseguram a este território tantas qualidades para a produção fotovoltaica como na maioria do continente. Trata-se de uma transição das fontes energéticas convencionais para as fontes alternativas que deve servir de exemplo para todo o mundo.

Os eucaliptais têm cinco vezes mais apoio governamental e europeu que a floresta nativa. Não é surpreendente, portanto, que uma proporção mais elevada de Portugal é coberta por esta árvore exótica que qualquer outro país. A preparação do solo para tais plantações, muitas vezes removendo a maioria da vegetação existente e até criando terraços com bulldozer, causa erosão do solo significante e assoreamento das ribeiras. Ademais, prejudica os recursos hídricos, aumenta o risco de incêndio - durante décadas têm havido mais incêndios aqui que em qualquer outro país europeu - e tem impactos na biodiversidade pelos quais a árvore é notória. As plantações monotípicas desta natureza são incompatíveis nas áreas designadas à protecção de espécies ameaçadas.

A topografia variada desta paisagem ondulada e acidentada fornece uma diversidade de habitats, mais frescos e mais quentes, mais húmidos e mais secos. A vegetação é invariavelmente mais densa perto das linhas de água e geralmente também nas ladeiras viradas a norte, que são relativamente frescas e retêm humidade durante mais tempo que costas orientadas ao sul e oeste. A floresta mediterrânica nas ladeiras a norte é, portanto, bem desenvolvida, sobretudo ao longo do canal mais húmido que a atravessa a meio.

Embora os verões na Ribeira de Seixe sejam mais temperados do que nas regiões continentais a leste, são, porém, longos e dessecantes. Este facto associado à predominância da esteva (<i>Cistus ladanifer</i>) - no matagal autóctone uma planta pirófita altamente inflamável - predispõe o território aos incêndios estivais e outonais. Apenas consegue sobreviver a vegetação adaptada a este fenómeno, nomeadamente o sobreiro (<i>Quercus suber</i>, desde que a sua cortiça não tenha sido extraída recentemente), espécies como o medronheiro <i>Arbutus unedo</i>, a zambujeira <i>Olea europaea var. sylvestris</i>, e a aroeira, ou lentisco, <i>Pistacia lentisco</i>, capazes de rebentar após terem sido queimados. As restantes árvores, como se vê na imagem, podem morrer.

Graças a um conjunto de afluentes, como este escondido nas sombras do sol baixo de inverno, a Ribeira de Seixe corre o ano inteiro, mesmo depois de secas, em verões mais longos e quentes. Ao restaurarmos a paisagem, devolvendo-lhe a sombra das espécies frugais autóctones, a terra conservará maior humidade, e os córregos e a ribeira fornecerão ainda mais água, tão essencial à vida.

Porquê esta imagem?

A nossa primeira imagem fornece pistas – ver Pontos de Interesse – acerca das razões por que uma bacia hidrográfica recôndita e pouco conhecida no sudoeste de Portugal é especial. Embora a sua paisagem suave tenha sido povoada e submetida à caça e à agricultura durante milhares de anos, ainda conserva vestígios daquele que foi, no final da última era glacial, um refúgio vital para a biodiversidade. Foi nessa era que as plantas e os animais das partes mais abrigadas da Península Ibérica se disseminaram, rumo a norte, para repovoarem o continente, à medida que o frio e o gelo recuavam. Como veremos, por razões bastante distintas a nossa área poderá voltar a ser um refúgio climático.

É por causa destes vestígios de biodiversidade que os 254 km2 da Bacia Hidrográfica da Ribeira de Seixe ganharam lugar na Rede Natura 2000. Esta rede da União Europeia compreende o maior sistema de áreas protegidas do mundo, com o principal objetivo de impedir perdas adicionais de espécies e habitats valiosos e ameaçados. O valor deste habitat reside no facto de ser representativo do ecossistema mediterrânico, apresentando um clima particular com comunidades biológicas raras. Embora ocupem apenas dois por cento da superfície da Terra, estes ecossistemas mediterrâneos albergam 20% das plantas vasculares do planeta, sendo por isso centros vitais, reservatórios preeminentes quer para a diversidade das plantas, quer para a dos animais. (Médail & Quézel, 2001).

Proteger os ecossistemas mediterrânicos é uma prioridade, uma vez que, como aconteceu com as pradarias pelo mundo fora, estes poderão sofrer, proporcionalmente, a maior quebra de biodiversidade das próximas décadas, devido a sua suscetibilidade a fatores de agressão como os regimes de exploração da terra, o aquecimento global e a contaminação. (Sala OE, et al., 2005).

Quê nos diz esta imagem – voltada aproximadamente para sudeste, acima da Ribeira da Azenha, a oeste da Ribeira de Seixe – sobre o modo como este reduto da biodiversidade mediterrânica pode contribuir para proteger o sistema da Rede Natura?  Ao passar o cursor sobre cada uma das elipses, verá uma breve explicação.

REFERÊNCIAS
[1] Médail, F. & Quézel, P. (2001) Biodiversity hotspots in the Mediterranean Basin: setting global conservation priorities. Conservation Biology 13(6), 1510–1513.
[2] Sala OE, et al. (2005) Biodiversity across scenarios. In: Millennium Ecosystem Assessment, Ecosystems and human well-being: scenarios, volume 2. Washington, DC: Island Press, pp. 375-408.

Folhas do Carvalho de Monchique