Contexto
O Projeto TerraSeixe nasceu das preocupações em torno do estado precário de conservação da Bacia Hidrográfica da Ribeira de Seixe. Motivo de especial cuidado era o Carvalho-de-Monchique (Quercus canariensis), uma espécie endémica que, apesar do reduzido número de espécimes, existe neste vale em número maior do que em qualquer outro lugar de Portugal. Além disso, há na flora e na fauna da bacia do Seixe uma série de outras espécies incomuns, e até alguns vestígios, cada vez mais raros, de florestas Floresta Laurissilva, hoje em estado de profunda degradação.
A estrutura do Projeto desenvolveu-se a partir da área geográfica designada Bacia Hidrográfica da Ribeira de Seixe. Há três Instrumentos de Conservação da Natureza (ICNs) que, sobrepostos, oferecem enquadramento jurídico para 90 por cento (229 km2) dos 254 km2 que constituem a bacia hidrográfica [1]. A Rede Natura 2000 e a IBA (Áreas Importantes para as Aves) são os dois Instrumentos concomitantes que cobrem 229 km2 (ou 90 por cento) da bacia hidrográfica [1, 2, 3]
A Rede Natura 2000 tem como principal objetivo a “conservação de determinados habitats e espécies, [para o que] as atividades humanas deverão ser compatíveis com a preservação destes valores, visando uma gestão sustentável do ponto de vista ecológico, económico e social” [2]. Por seu turno, a IBA pretende implementar “medidas especiais de conservação relativas ao habitat das espécies protegidas e às espécies migratórias com presença regular no país, assegurando que estas zonas mantenham uma estrutura que evite a poluição e a deterioração dos habitats, e tomando medidas para preservar as aves” [3].
Além disso, há ainda, ao longo da costa, uma outra área protegida sobreposta, cobrindo 9 km2 (ou 3,5 por cento) da Bacia Hidrográfica da Ribeira de Seixe [1]. Trata-se do território que integra o estuário da Ribeira de Seixe e que pertence à Rede Nacional de Áreas Protegidas, conhecido como Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. O objetivo deste parque natural da orla costeira é apoiar a “conservação, a legislação, o planeamento e a gestão” [4].
Apesar destas iniciativas destinadas à conservação do património natural, a densidade da monocultura de eucaliptais é elevada e continua a crescer, constituindo um obstáculo aos ICNs. Em vez de conservarem e protegerem os habitats e as suas espécies endémicas, estas plantações têm vindo a substituir cada vez mais os habitats naturais supostamente protegidos.
Uma bacia hidrográfica habitada como a da Ribeira de Seixe deve ser entendida como uma paisagem multifuncional. Segundo a Convenção Europeia da Paisagem, as paisagens são zonas “observadas pelas pessoas cujas características resultam da ação e interação de fatores naturais e/ou humanos” [5]. Por via desta abordagem à bacia hidrográfica, o Projeto TerraSeixe propõe que se interprete esta paisagem como fonte de benefícios, bens e serviços proporcionados pelo meio ambiente. Isto implica que, na gestão da bacia hidrográfica, se reconheçam tanto as aspirações humanas, quanto as necessidades ecológicas.
Uma tal abordagem poderá resolver eventuais conflitos que surjam não só entre os habitantes da bacia hidrográfica, como também entre as atuais atividades de exploração da terra e aquelas que são compatíveis com os ICNs. Se alcançarmos este equilíbrio entre a atividade humana, por um lado, e os habitats e as espécies naturais, por outro, será enfim possível assegurar a proteção e conservação da vida selvagem.
REFERÊNCIAS
[1] Ferreira AI, Jerónimo M. (2015) Instrumentos de Conservação da Natureza na Bacia Hidrográfica da Ribeira de Seixe. Lisboa: GEOTA.
[2] Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) Natura 2000. Disponível em: https://www2.icnf.pt/portal/pn/biodiversidade/rn2000.
[3] Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) Aves. Disponível em: https://www2.icnf.pt/portal/pn/biodiversidade/rn2000/p-set/psrn-aves.
[4] Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) Áreas Protegidas: 12. Disponível em: https://www2.icnf.pt/portal/ap.
[5] The European Landscape Convention of the Council of Europe. Disponível em: https://www.coe.int/en/web/landscape.
Quercus canariensis, a segunda árvore nativa mais grande do país e emblemática da iniciativa TerraSeixe. Fragmentos sobrevivem na Espanha e nas montanhas do noroeste africano. Os melhores exemplares ornamentais estão em jardins da Austrália e Nova Zelândia.
Tipo de floresta mediterrânica que se encontra nas zonas mais elevadas e húmidas da Bacia Hidrográfica da Ribeira de Seixe, albergando lauráceas, nomeadamente o loureiro (Laurus nobilis). Na Europa, estas florestas existem em Portugal continental, na Ilha da Madeira e em Espanha.